REFLEXÃO SOBRE A ORAÇÃO DO PAI NOSSO
Pai Nosso que estais nos céus, santificado seja o vosso nosso; venha nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia nos dais hoje; perdoai-nos as nossas ofensas, assim como perdoamos a quem nos tem ofendido; e não nos deixeis cair em tentação mas livrai-nos do mal. Amém.
O PAI NOSSO APARECE DUAS VEZES NO NOVO TESTAMENTO, EM MATEUS E EM LUCAS, COM ALGUMAS DIFERENÇAS:
A
oração do Pai Nosso é sem dúvida nenhuma a principal fórmula de oração cristã.
Ela é de suma importância, pois nos foi dada pelo próprio Jesus Cristo. Ou seja,
o próprio Deus, como Verbo Encarnado, nos mostra a maneira correta e eficiente
de orar.
Por isso, o Pai Nosso é chamado de ORAÇÃO DOMINICAL, ou seja, ORAÇÃO DO SENHOR.
Cristo, como Verbo Encarnado, sabe exatamente das necessidades dos seus irmãos
e irmãs humanas. E como Filho de Deus nos ensina esta oração. Mas Cristo não
quer que repitamos esta oração maquinalmente. Ela deve ser proferida com
humildade e confiança com o auxílio do Espírito Santo.
O Pai Nosso é realmente o resumo de todo o Evangelho. Depois de nos ter legado
esta fórmula de oração, o Senhor acrescentou: “Pedi e vos será dado” (Lc 11,9).
Cada qual pode, portanto, dirigir ao céu diversas orações conforme as suas
necessidades, mas começando sempre pela oração do Senhor, que permanece a
oração fundamental.
Percorrendo todas as orações das Escrituras, é difícil encontrar nelas algo que
já não esteja incluído no Pai Nosso.
São Tomás de Aquino já dizia: “A ORAÇÃO DOMINICAL é a mais perfeita das
orações... Nela não só pedimos tudo quanto podemos desejar corretamente, mas
ainda segundo a ordem em que convém desejá-lo. De modo que esta oração não só
nos ensina a pedir, mas ordena também os nossos afetos.”
* PAI NOSSO – logo no início da oração do Senhor nos é dada uma revelação
essencial. Deus em seu infinito Amor nos adota como seus filhos. E nos ensina a
rezar não só por nós mesmos, mas pelos nossos irmãos, por toda a comunidade.
Pois nós não rezamos “Meu Pai” e sim “Pai Nosso”. Ao chamar Deus de Pai,
estamos reconhecendo que Ele é a fonte da vida, o poder supremo, a misericórdia
infinita; que nos fiamos Nele e Dele esperamos tudo; que nossas relações com Ele
sejam filiais, cheias de amor e de respeito. A palavra “Pai” fala, por si
mesma, de amor, e quando se refere a Deus, fala de seu amor infinito para
conosco, por Ele demonstrado ao entregar seu Filho único para a salvação do
mundo (IJo 4,1-11). E como é um bom pai, dá-nos aquilo de que necessitamos,
satisfaz nossos caprichos, suporta nossas impertinências e compreende nossas
fraquezas, dizia Santa Teresa de Jesus: “Sendo Pai, há de nos tolerar, por
graves que sejam as ofensas. Se voltarmos para Ele, como o filho pródigo, há de
nos perdoar, há de nos consolar..., há de nos presentear, há de nos sustentar”.
Se a palavra “Pai” nos fala do amor a Deus, a palavra “nosso” fala-nos do amor
ao próximo. O Pai-Nosso é a oração dos filhos e dos irmãos. Somente partindo do
amor é que podemos recitar o Pai-Nosso.
* ... QUE ESTÁS NOS CÉUS – esta parte nos dá a entender que Deus não está
especificamente em um lugar material, mas Ele está além de tudo. Ou seja, nos
dá a ideia da transcendência de Deus. Deus não está circunscrito a um lugar
concreto. Está em todos os lugares como nos revela o salmo 139, 8-10: “ Se
escalo o céu, aí tu estás; se me deito no abismo, aí estás. Se eu me transladar
até a orla da aurora ou me instalar nos confins do mar, aí tua esquerda se apoia
em mim e tua direita me agarra”. Está em nós mesmos, e sequer o vemos, porque é
“o Deus escondido” (Is 45,15), que há de ser procurado e descoberto. E se não o
descobrimos em nós mesmos, é porque não o descobrimos antes nos irmãos. Por
esse motivo, somente rezaremos bem o “Pai Nosso que estás nos céus”, se
praticarmos o “Pai Nosso que estás na terra: entre nós”. Deus está aqui, a
nosso lado, não esta além das estrelas.
... Que estás nos céus
Conduz-nos pela mão e na obscura
solidão da noite te chamamos
e, sem saber teu nome, nomeamos-te,
perdidos entre o prazer e a amargura.
Não sabemos teu nome e sonhamos contigo,
mais íntimo a nós que a pura
transparência do ar, e a tua ternura
é nossa sede de amor quando choramos.
Se estamos assim perdidos, e a brisa
apenas murmura teu nome celeste,
tão suave como seda ou veludo,
Deixa que o homem grite em sua esperança,
como uma criança movida por teu sorriso,
Pai Nosso, que habitas no céu. ( V. Sanchez Pinto).
* SANTIFICADO SEJA O VOSSO NOME – nesta passagem reconhecemos a Santidade de
Deus, e queremos que todo mundo o trate de maneira santa, como o Único que
santifica e que é Santo por natureza. Para isto devemos igualmente caminhar no
sentido de nossa santificação, pois como Ele mesmo disse: “Sede santos, porque
eu vosso Deus, sou santo” (Lv 19,2). Jesus também nos comunica isto em outra
passagem: “Sede, portanto, perfeitos como vosso Pai do céu é perfeito” (Mt
5,48). Santificar o nome é reconhecer a Deus como criador do mundo e
Senhor da história, reconhecê-lo e acatá-lo como o único Senhor soberano,
cumprir o primeiro mandamento da lei, o direito de Deus a ser o “único”,
direito absoluto, indeclinável, intangível, constitutivo da própria essência de
Deus; por isso mesmo, direito sagrado, irrenunciável. O homem não pode
construir para si outros deuses, porque esses não são deuses, são ídolos, ou
seja, a vacuidade, o nada. O maior perigo para o homem é cair no nada, no
vazio; ou, então, estar acorrentado por esses falsos deuses do dinheiro,
consumismo, a vaidade e a morbidez que a sociedade apresenta à nossa adoração.
Pedimos que o mundo tome consciência de que Deus é Deus de que não existe
outro.
* VENHA A NÓS O VOSSO REINO – quando pedimos que venha o Reino, estamos pedindo
algo que afeta substancialmente nossas vidas, algo que interessa a nós, e não a
Deus. Para Deus nada pedimos, porque, além do mais, Ele não tem necessidade de
nada; pedimo-lo para nós, para nossa felicidade temporal e eterna. Santo
Agostinho dizia; “ ao fazer esse pedido, não rogamos por Deus, e sim por nós
(pois dizemos ‘venha teu Reino’ no sentido de que Deus comece a reinar); direi,
outrossim, que seremos nós seu Reino, se, crendo nele, tirarmos proveito dele.
Todo os fiéis redimidos com o sangue do Unigênito serão o reino de Deus”.
“O Reino crescerá à medida que cada homem aprenda a dirigir-se a Deus como Pai,
na intimidade da oração (Mt 23,9), e se esforce por cumprir sua vontade” (Rm
13).
O posto central da súplica pela ‘vinda do reinado’ do Pai, com relação às três
primeiras súplicas de louvor, corresponde ao posto de destaque ocupado pela
catequese sobre o Reino no vasto contexto literário do Sermão da Montanha e, em
geral, de todo Evangelho de Mateus. Não de se estranhar, pois, que determine o
significado não apenas da primeira e terceira súplicas, mas também das três
últimas petições. Estas, com efeito rogam ao ‘Pai Celestial’ por aqueles dons
necessários (o pão cotidiano, o perdão das dívidas, a preservação de sucumbir à
tentação e a libertação do ‘maligno’ tentador) para, na obediente e filial
submissão à sua vontade, aceitar seu senhorio ou permitir que a eles ‘venha seu
reinado’, com o que seu ‘nome’ é glorificado. A súplica pela ‘vinda do reinado’
constitui, pois, o foco central do Pai-Nosso. Aqui pedimos que o Reino de Deus,
à volta de Cristo, no fim dos tempos, venha mais rápido. Pois nesse momento a
glória de Deus se manifestará a todos e os Justos verão a Sua Face. E da mesma
forma que esperamos o fim dos tempos, tentamos realizar o Reino de Deus, pelo
menos parcialmente, aqui na Terra; pois “o Reino de Deus é justiça, paz e
alegria no Espírito Santo” (Rm 14,17).
* SEJA FEITA A VOSSA VONTADE ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU – nesta passagem
reconhecemos a superioridade da Vontade Divina e desejamos ardentemente que ela
seja realizada. É importante ressaltar que devemos fazer este pedido com sinceridade
e que realmente desejamos que Sua Vontade seja realizada em detrimento da nossa
que é falha e nem sempre nos leva para o nosso bem. A Vontade de Deus é
perfeita por mais que, às vezes, não compreendemos. A Vontade de Deus é que nos
salvemos, por isso nos mandou seu Filho. E quer que amemos uns aos outros. Quer
que amemos a Ele acima de todas as coisas e que obedeçamos aos seus
mandamentos. Confiando na Vontade Divina e não na nossa encontraremos o
verdadeiro sentido da vida e o Caminho da Verdade. Pois Jesus disse: “Eu sou o Caminho
a Verdade e a Vida”. Fazer a vontade de Deus não é anular a nossa vontade, mas
fazê-la coincidir com a de Deus, identificar nosso querer com o seu, pois o
Reino cresce na proporção em que cada um de nós vai unindo sua vontade à de
Deus. Fazer a vontade de Deus é viver em harmonia, em paz e concórdia com os
demais, em generosa comunicação de bens e sentimentos; é praticar a tolerância,
saber conviver, aceitar os demais tal como são, amá-los do mesmo modo com que
Deus nos ama a Todos. Um cristão crê no amor e entrega-se ao amor (1 Jo 4,16).
Fazer a vontade de Deus é tornar-se propagador do mistério salvífico de Deus, a
utopia da salvação universal, a transformação do mundo, a nova criação.
QUANDO SE O QUE CRÊ REZA: ‘Seja feita a tua vontade’ há de ressoar em seu
coração a trágica realidade de um mundo que de forma alguma se ajusta à vontade
de Deus. Não podemos rezar esta prece no Espírito de Cristo se, não rezá-la,
não nos sentimos sacudidos pelo grito de milhares de homens, mulheres, jovens,
crianças e idosos que vivem na humilhação, na miséria, no desespero, assediados
pela injustiça, pela fome, pela violência, pelo ódio, pela vingança... . Todo
esse rio de lágrimas deve desembocar em nossa oração.
* O PÃO NOSSO DE CADA DIA NOS DAI HOJE – pedimos aqui com confiança filial, o
alimento de cada dia. Pedimos que Deus nos dê o mínimo necessário para
sobrevivermos dignamente, tanto bens materiais como espirituais. Basta que
procuremos o Reino de Deus, e como diz Jesus, tudo o mais nos será dado em
acréscimo. Disse isso para não nos preocuparmos excessivamente com as coisas
deste mundo e com nosso sustento. Não quer dizer com isso que devamos ser
passivos e esperar que tudo caia de bandeja nas nossas mãos. Mas disse isto com
o intuito de nos libertar da inquietação e preocupação. Este pedido também gera
um compromisso com nossos irmãos necessitados, pois se queremos que se cumpra
também devemos agir.
* PERDOAI AS NOSSAS OFENSAS ASSIM COMO PERDOAMOS A QUEM NOS TEM OFENDIDO –
neste pedido, confessamos que somos pecadores e apelamos para Misericórdia Divina.
Jesus Cristo veio ao mundo e morreu para permitir que nossos pecados fossem
perdoados. Ele nos deu a possibilidade do perdão das nossas inúmeras faltas.
Mas faz uma exigência. Que nós também perdoemos aqueles que nos ofendam. É
necessário esta reciprocidade. Esta é a única que exige uma resposta: para ser
perdoado, temos que perdoar. O perdão produz amor, a tal ponto que o amor está
relação direta com o perdão (Lc 7,36-49) Assim nos mandou fazer Jesus Cristo:
“Sejam misericordiosos, como também o Pai de vocês é misericordioso” (Lc 6,36).
É preciso perdoar de “coração” (Mt 18,35), perdoar e amar nossos devedores.
Perdoar sem esquecer e sem amar, não é perdoar, é antes uma maldade, uma
mesquinhez e uma vilania.
...”suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos mutuamente, se alguém tem
motivo de queixa contra o outro; como o Senhor vos perdoou, assim também
fazei-vos” (Cl 3,13).
*
NÃO NOS DEIXEIS CAIR EM TENTAÇÃO – este sexto pedido está ligado de certa forma
ao anterior, pois para alcançarmos o perdão dos pecados, devemos nos arrepender
e não querer pecar novamente. A misericórdia de Deus não atinge os duros de
coração, pois estes não a deixam penetrar. Como nós somos fracos, pedimos a
Deus Pai a força necessária para não sucumbirmos à escravidão do pecado. Como
dizia são Paulo: “ Tudo posso naquele que me fortalece”. O homem tem que
aprender a conviver com suas fraquezas e com suas quedas, saber perdoar a si
mesmo, pois se Deus o perdoa, por que ele não perdoará a si mesmo?
A tentação é a prova da fé, como o é também da fraqueza humana. Nela o homem
toma consciência de que, por si só e por suas próprias forças, a queda é
inevitável. Orígenes dizia: “É preciso orar, não para deixar de ser tentados, o
que é impossível, mas para não ser levados pela tentação”.
* MAS LIVRAI-NOS DO MAL – este pedido é uma referência bem específica ao maligno. Jesus Cristo nos redimiu, isto é, libertou-nos de todo o mal. Livrar-nos do mal não pode significar outra coisa a não ser livrar-nos da escravidão. A vitória de Jesus Cristo sobre o mal e o maligno significa e ajuda o aniquilamento de todos os demônios. O Pai Nosso implica o esforço e a luta pelo triunfo final do bem sobre o mal, do amor sobre o egoísmo, como meta que deve guiar nossos passos e nossas esperanças. Nesta petição final, pedimos a Deus que nos livre de todos os males, mas que não o deixe para o céu. Assim o fará, porque essa é a única maneira pela qual a libertação que Jesus Cristo realizou na terra seja realmente efetiva também na terra. Em certo sentido, esta última petição resume todas as súplicas anteriores, pois o nome de Deus somente pode ser santificado nos libertados do Maligno, mediante a vinda do seu reino, e com o cumprimento de sua vontade, somente eles podem receber o pão supersubstancial e o perdão; somente a eles é garantida a vitória na tentação. E isso significa: O Pai Nosso é a prece da libertação cristã, a prece radical e verdadeira libertação. No Pai Nosso, pedimos ao Senhor sete coisas. Todavia em contrapartida, ele também nos pede algo. Para que possa realizar essas sete coisas, e para que as possamos conduzir a um final feliz, ele nos pede apenas uma: que vivamos como irmãos e irmãs, que nos amemos como ele nos ama.
*
AMÉM – Significa “que assim seja”. Com esta expressão exprimimos o nosso Fiat
(faça-se), nossa vontade que os sete pedidos sejam realizados, tudo isso,
graças ao poder infinito da redenção de Cristo.
Pai...
Mãe...
De olhos mansos:
Sei que estás, invisível, em todas as coisas.
Que teu nome me seja doce,
A alegria do meu mundo.
Traze-nos as coisas boas em que tens prazer:
O jardim,
As fontes
As crianças,
O pão e o vinho,
Os gestos ternos,
As mãos desarmadas,
Os corpos abraçados...
Sei que desejas dar-me o meu desejo mais fundo,
Desejo que esqueci...
Mas tu não esqueces nunca.
Realiza pois o teu desejo para que eu possa rir.
Que o teu desejo se realize em nosso mundo, da mesma forma
como ele pulsa em ti.
Concede-nos contentamento nas alegrias de hoje:
O pão,
A água,
O sono...
Que sejamos livres da ansiedade.
Que nossos olhos sejam tão mansos para com os outros
Como os teus o são para conosco. Porque se formos ferozes
Não poderemos acolher a tua bondade.
E ajuda-nos para que não sejamos enganados pelos desejos
maus e livra-nos daquele que carrega a Morte dentro dos
próprios olhos.
Amém!
Rubens Alves
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